terça-feira, 18 de outubro de 2011


MEDO

Caminhar pela calçada adormecida em busca do que lhe faltava, contemplando os seus pés encharcados em águas mil, não podia ser a única maneira de afogar o seu lamento... Apetecia-lhe espreitar a vida, ouvir outras músicas, embriagar-se com aromas exóticos, vestir-se de fantasias, para elegantemente se despir e enfim nua, completamente nua, tocar os sinos... para que todos viessem às janelas e a vissem assim, de braços estendidos, rodopiando entre grossas pingas de chuva... desenhando silhuetas cheias de sedução e pecado... e a admirassem, a desejassem muito, tanto...até desfalecerem famintos e gulosos em desejos desmedidos... mas sem nunca a possuírem...
Todos os sentimentos a assaltavam e sentia prazer nisso... Malvada, vadia, selvagem, mas doce...tudo isto numa mistura que a deixava em pleno êxtase.
Nem de longe nem de perto iria penalizar-se por este estado de alma, de resto tinha a certeza que mal a chuva parasse... todo este sentir, como num passo de mágica, diluir-se-ia num mar de espuma, em lençóis de candura...
E de volta, a mulher em mil pedaços, sofrida, suada, partida, mas ainda assim, com vontades loucas e firmes, de agarrar todas as carícia para preguiçar em leito de esmeraldas, à espera que o novo dia amanheça lindo e sem desenganos, apenas com o impulso da sensação de tudo ter, ignorando por completo todas as ausências...
Afinal existem manhãs e basta aproximar a mão do pensamento, inquieto de tanta imaginação e em ritos de celebração, rasgar as teias, em que tantas vezes nos deixamos emaranhar... com um único medo... medo da solidão... medo de ser só...


Milena Guimarães

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