INSTANTES





Rodopiando ao vento como folha arrancada da árvore, alheia ao destino traçado, cheio de inquietude, vestindo apenas uma túnica branca bordada de luar, seguia sempre por caminhos de grandes obstáculos, vencendo uns, derrubando outros e batendo de frente com alguns, certa de que o risco da aventura, sem qualquer sombra de dúvida, era o único jeito de tantos acertos, na sua maioria patrocinados pelos erros cometidos.

Caminhando sempre, tendo como companhia o desconhecido e encantada com a sua existência, permitia-se rir escancaradamente, até das lágrimas repescadas no silêncio da memória, que tantas vezes lavavam o seu rosto, transformando as pequenas manchas em pétalas de flores, orvalhadas pela madrugada de uma inocente primavera.

E numa satisfação interior, completa, quase perfeita, abraçava os verões escaldantes, em noites de lua cheia, entoando cantigas de bem querer, acreditando na força do seu pensamento, em rios de prata banhando leitos de ilusão, em mãos estendidas tocando horizontes sonhados, em olhares nus espreitando nesgas de felicidade, em ouvidos moucos à maledicência da frustração, negando-se sempre à incompetência de sentimentos moribundos à míngua de partilha, na música da alegria enraizada na consciência do ser, na visão suicida de acabar de vez com o apodrecimento da luta desesperada, no prazer de aumentar o “gosto de viver”, sem excepções, desatando uma a uma, todas as regras que apenas conseguem castrar a própria vida...

Sentada nas fragas da sua alma, brincava com os fios do tempo, tecendo as teias onde gostava de se prender, esculpindo na coragem do seu sangue, figuras fantásticas, sem contas com o passado, a contas com o presente, diante do incerto amanhã...



Milena Guimarães